Por Redacção
Entrevista com Sapalo António, membro de direcção do
Partido de Renovação Social (PRS). Nos últimos dias, os renovadores sociais têm
sido alvo de notícias, muito por culpa da postura incoerente de seu líder.
Entretanto, para melhor informar a sociedade sobre o que realmente se passa a
nível interno do 4º maior partido angolano, conversamos com Sapalo António, que
já foi presidente da bancada parlamentar desta formação política, fruto do
pleito de leitoral de 2008.
Durante o pingue-pongue,
Sapalo António, que deseja se sentar ao cadeirão máximo do PRS, ainda ocupado
por Eduardo Kwangana há mais de 20 anos, deixou transparecer que poderá levar o
actual líder do partido aos Tribunais, caso Kwangana continue a violar os
estatutos partidários, e, compromete-se, caso seja eleito presidente do PRS e
concomitantemente da República, acabar com relações bilaterais que não
favoreçam os valores angolanos.
Disputas Políticas (DP): Doutor Sapalo, como tem passado?
Sapalo António (SA): Estou bem. Sou um óptimo chefe de família,
sou trabalhador, faço política no quadro desta adversidade que considero
complexa, e, do ponto de vista financeiro, a minha situação continua semelhante
aos demais, vivo dificuldades económicas e financeiras.
DP: Sabe-se que militou no MPLA. Que funções desempenhou
e porque abdicou delas até abandonar o partido?
SA: Comecei a me envolver em política de forma inocente, na
década de 60. Nesta altura era muito miúdo e na área em que cresci, em zona de
Casage, havia os três Movimentos: primeiro a UNITA, porque foi a UNITA o
primeiro Movimento no Leste de Angola, depois a FNLA e, posteriormente, o MPLA.
Ora, o meu tio colaborava com os três movimentos, e eu era encarregue de levar
sal, sabão aos guerrilheiros do MPLA porque era difícil para os mais velhos,
por causa da PIDE. Já em 1974, com a entrada dos movimentos, fui designado a uma
função e fui evoluindo até chegar aqui em Luanda.
Já na década de 80, fui
secretário da JMPLA nas Ingombotas, coordenava os núcleos de uma empresa de
construção, coordenava o núcleo do partido na COFA, era o padrinho dos núcleos
da JMPLA na Condauto – que era uma escola de condução, do Ministério da
Educação, do Hotel Trópico, pese embora já desenvolvia uma postura opositora. Portanto,
chegados em 1990, saí para aderir ao PRS, ao qual estou até ao momento.
DP: Observando de fora, percebe-se que há uma animosidade
crescente entre o vosso presidente - Eduardo Kwangana e o doutor Sapalo, o que
se passa em concreto?
SA: Do meu lado e dos militantes não se passa nada. Estamos apenas
preocupados porque não percebemos o que de facto se está a se passar com a
liderança, nós temos um estatuto e este líder não cumpre com os estatutos. Já
devíamos ter realizado o Congresso, mas continua inviabilizado, portanto, o
problema passa pela inviabilização do congresso e a violação dos estatutos. No
momento, estamos a fazer um esforço para levar o presidente à razão.
“Frustrei
a pretensão do presidente”
DP: Há fontes que garantem que o presidente Kwangana
encontra-se muito doente… Espera que ele (Kwangana) convoque o Congresso, mesmo
estando doente?
SA: … Ele diz que está doente e se encontra fora do
país, mas mesmo assim, não pode inviabilizar o Congresso. Se fazermos a uma
avaliação jurídica e política vamos compreender que o congresso devia ter lugar
em junho do ano passado (2016), sob decisão do Comité Nacional. Por sua vez, o
presidente devia cumprir essa decisão, mas não cumpriu e nessa altura ele não
se encontrava doente. Inviabilizou absolutamente, porque se apercebeu do
surgimento de potenciais candidatos, pois pensava que concorreria a solo,
portanto, o surgimento de candidatos frustrou o presidente.
DP: Insisto: Espera que ele (Kwangana) convoque o Congresso, no
alegado estado de saúde em que se encontra?
SA: O Comité Nacional convocou o Congresso para Março e nesta
altura ele não estava doente. O problema não se coloca à doença, as normas
jurídicas são claras. Pois o presidente está há mais de cinco meses
incomunicável com a organização que dirige, e sabe-se que para toda
organização, os actos são diários e ele foi eleito para realizar estes actos
diários e, também, o facto de se estar doente não significa que deve estar incomunicável.
A organização tem de saber o estado de saúde de seu líder, a pergunta é: está
em estado de coma? Ele só não consegue convocar o Congresso se estiver em
estado de coma, e se estiver em estado de coma e porque estamos no fim do
mandado dele, significa que o presidente está num estado de invalidez. Estando
num estado de invalidez, logo, ele não pode concorrer porque está incapacitado.
Se até agora está fora, está doente, está no fim de mandato, está em estado de
invalidez e não pode concorrer.
DP: O que sugere?
SA: Para salvaguardar os interesses supremos do partido, e
porque o mandato dos órgãos expiram em maio, o seu substituto assume essa
responsabilidade de convocar o congresso, porque o presidente não tem
competência para decidir sobre o referido conclave. A competência é do Comité
Nacional, este já decidiu, cabe ao presidente ou ao seu substituto formalizar,
como os exige o Comité Nacional, de acordos aos estatutos do partido. Ao não
convocar o Congresso, o presidente incorre a uma desobediência.
DP: Não há meios de negociação interna?
SA: O problema é o bloqueio tanto da parte do presidente como
do secretária-geral, mas há uma questão, o presidente deixa de ser presidente
em maio e os órgãos de direcção deixam de existir e, o estatuto não prevê que
os órgãos do partido continuam em funções, caso não se realize o congresso.
Portanto, não é possível qualquer negociação, porque a inviabilização do
congresso foi feita propositalmente pelo presidente e pelo secretário-geral.
DP: O que fazer?
SA: O Tribunal é claro, aliás, é a entidade competente, mas
estamos a esgotar todos os recursos internos, porque estamos ainda a pensar,
isto se reflectirmos do ponto de vista técnico-jurídico, que o próprio órgão
(Comité Nacional) que tem competência de decidir pela convocação, e porque o
presidente apenas formaliza e essa formalização não é numa perspectiva de
decisão, mas numa perspectiva de obediência ou dever, ao não cumprir incorre
numa infracção de desobediência, numa infracção punível, logo, o órgão que tem
competência pela realização do Congresso pode assumir a responsabilidade de o
convocar.
“A
existência de potenciais candidatos tira o sono a Kwangana”
DP: Qual é o modelo dos Congressos do PRS
SA: O nosso modelo de congresso consta dos nossos estatutos,
quer dizer: O Congresso é realizado de cinco em cinco anos e o extraordinário
dependentemente da situação. O comité Nacional delibera e o presidente
formaliza. Depois da convocação do Congresso cria-se o comité nacional
preparatório ou organizador do Congresso e, nas estruturas intermédias, que são
as comunas, municípios e províncias, criam-se também as suas comissões
preparatórias. E na base – que são os núcleos, criam-se as assembleias de base.
A base elege para comuna, este para o distrito, daí para os municípios e estes
para províncias e as províncias elegem delegados ao congresso. O congresso
elege o presidente e o comité nacional.
DP: Mas ter múltiplas candidaturas não é vosso apanágio?
SA: Ora, o presidente Kwangana foi eleito na primeira
conferência (1990/91), onde participaram várias candidaturas. De lá para cá, passou
a concorrer sozinho, não porque tenha havido impedimentos. Mas desta vez,
queremos dar outra roupagem ao partido, promovendo múltiplas candidaturas e é
isso que está a complicar ao Kwangana. Nos congressos anteriores, nenhum outro
militante manifestou vontade de se candidatar, a mudança do anterior quadro
representa um risco para Eduardo Kwangana, daí a criação de mecanismos para
inviabilizar o congresso.
DP: Quais as reais motivações que levam o doutor Sapalo a
candidatar-se à presidência do partido?
SA: O PRS é uma organização política de vocação governativa. O
objectivo do PRS é governar, aliás, este é o objectivo de qualquer partido, mas
para se alcançar tal desiderato é preciso que o partido seja forte, seja
actuante, conquiste credibilidade. A credibilidade pública deve ser conquistada
e deve ser conquistada com acções concretas que traduzem acções de um partido
opositor. E esta actuação que se traduz na busca de credibilidade é determinante
também, para a busca de confiança, porquê? Porque o partido não ganha somente
com o voto de militantes. No entanto, é preciso que o partido seja forte e,
para isso, a imagem do líder é determinante. O líder tem de encarnar esta
missão do partido numa perspectiva do poder, porque se o líder não encarnar o
espírito do partido ou se o líder não tem ambição, acomoda-se, cai em
conformismo e é isso que nós vivemos, isso tem consequência negativa sobre o
próprio partido e sobre o país, porque o país precisa de partidos fortes ou
seja, o país precisa de mudança.
O que estou a dizer é
realizável se utilizarmos todos os recursos políticos de forma pacífica para
que, de facto, o partido atinja espaço que lhe leva ao poder e é isso que falta
no actual PRS.
PRS é o
partido com melhores ideias em Angola
DP: O PRS tem chance de vencer às eleições?
SA: Claro! O PRS é até aqui, o único partido com ideias novas
para o país, tanto de ponto de vista político, de ponto de vista social,
económico e cultural, é o único que neste momento que tem projecto novo e contemporâneo
para o país. O que falta? Falta um líder que consiga levar a sociedade a
compreender os objectivos do partido e é isso que me motiva a se candidatar.
DP: Sr. Sapalo, a situação socioeconómica dos cidadãos
não os permite votar em rostos bonitos, votam em programas, que propostas tem
para tirar os angolanos do sufoco?
SA: Olha, desejo apostar fortemente na educação, que é o
pilar para um futuro melhor. Neste quesito, se fazermos uma análise comparativa
do passado com o presente, na era colonial, a pessoa com a 4ª classe já era um
grande quadro, e é esta a nossa visão. Pois nós queremos, com o PRS no poder e
sob liderança de Sapalo, que o jovem com a 4ª classe, 6ª classe, com a 8ª e 12ª
classes seja uma pessoa devidamente preparada não só para o mercado de
trabalho, mas também, que tenha uma visão de cidadania considerável. Que seja
um cidadão critico consigo mesmo, critico com a sociedade e que promova as
transformações necessárias para a sociedade.
Do ponto de vista
económico, quero acreditar que para qualquer governo, o pilar da governação tem
de ser a economia. Fiquei preocupado ao ouvir hoje, um dirigente do partido que
governa há muito tempo Angola, a falar da diversificação económica, apenas
agora. Para mim, qualquer partido ou pessoa que ganha às eleições deve saber
que o programa económico é determinante, porque é à volta da economia que tudo
gravita. Com o PRS no poder e sob liderança de Sapalo, acreditem, nós temos
políticas devidamente definidas para a promoção do desenvolvimento económico.
Não posso entrar muito em
detalhes, por uma questão estratégica. Mas por exemplo, o nível de desemprego
hoje é elevado e prometo que vamos combate-la, promovendo o crescimento e o
surgimento de empresas: micro, pequenas e grandes empresas. Vamos criar
condições favoráveis, coisa que não há até agora, para o surgimento de novas
empresas e aquelas que existem, deverão crescer mais. Acreditem, o nível de desemprego
é muito elevado, mas com o PRS no poder e sob liderança de Sapalo, o desemprego
vai baixar.
“Só o
Federalismo poderá tirar o país da hecatombe”
DP: Mas como vai fazer isso?
SA: Nós vamos trabalhar nas despesas do governo, como? Ainda
é cedo para desmitificar, vamos trabalhar nos impostos, como? Também ainda é
cedo para os dizer. Mas acredite que quando surgirmos no governo, também vão
surgir muitas empresas e aquelas que existem vão crescer ainda mais, e isso irá
proporcionar a entrada de capitais externos, face a nossa política fiscal ou
tributária. Para além disso, seremos amigos de valores, como a liberdade e
democracia.
Para mim, a melhor forma de
evitar conflitos é produzir leis que asseguram o pleno exercício da democracia,
da plena liberdade do cidadão, contrariamente ao que existe hoje. Pois, os
direitos fundamentais consagrados na nossa Constituição, consagrados na carta
das Nações Unidas, consagrados na carta da União Africana, hoje em Angola, esses
direitos são, até certo ponto, violados com a criação de legislação que atenta
contra os valores, com o único propósito de proteger a minoria governante. Eu
garanto que com o PRS no poder e tendo Sapalo António como presidente da
República, em termos de liberdade de imprensa, em menos de dois meses, Angola
vai superar a Finlândia, essa é a minha aposta. Pois não queremos ver
jornalistas a serem presos. A legislação toda que foi aprovada contra a classe jornalística
ou contra a liberdade de expressão vai toda ser regista, porque, para mim, o
princípio fundamental é destruir a injustiça para construir a justiça, para
mim, essa é uma legislação contra a justiça.
Com o PRS no poder e sob
liderança de Sapalo, Angola terá que estar ao melhor nível de desenvolvimento
em todos domínios da vida, desde políticos, sociais etc. Hoje não se aceita
andarmos aqui há 40 e tal anos, encontrarmos bairros históricos sem água
canalizada, hoje criarmos aquela legislação que atenta contra a existência das
pessoas no exercício de suas funções. Não se admite.
DP: Então, o que fazer do sistema de justiça?
SA: O actual sistema justiça é fraco por continuar
partidarizado, não actua na base de sua consciência e da legislação, actua na
base da visão política da liderança do país. O nosso sistema está ao serviço de
um determinado grupo ao qual protege. Por exemplo, a miséria que vivemos é
produto da corrupção promovida por eles, infelizmente, sabem que a corrupção corrói
a sociedade através de branqueamento de capitais etc. Para alterarmos o quadro,
nos propusemos a devolver o poder ao povo, promovendo uma reforma na
organização do Estado.
A forma de organização de
Estado vigente é herança do regime português, que é o Estado unitário – o que
significa: «poder na mão de uma só pessoa». Enquanto Portugal, com a revolução de
25 de Abril de 1974, operou reforma, nós já não! Herdamos do colono essa prática
de poder na mão de uma única pessoa e quando uma pessoa detém todos os poderes,
ele se torna arrogante, faz e desfaz. E nós percebemos que quando o poder está
com uma só pessoa, que tem a prerrogativa de nomear todos e exonera quando
quiser há vícios, os governantes não respeitam os governados, então, para
contornar isso, queremos impingir o Federalismo – em outras palavras, a
descentralização política.
DP: Explique-se melhor.
SA: Enquanto no Estado unitário o poder é concentrado numa só
pessoa, no Federalismo, o poder é compartilhado por todos através de eleições.
O poder é partilhado por todos e a todos os níveis, por exemplo, se temos o
Parlamento Nacional, também deve haver Parlamento Provincial e Municipal – quer
dizer que o povo a nível nacional elege os deputados a nível nacional e o governo
central, e cada povo a nível das províncias elege os seus governos e seus deputados
e também nos municípios, neste sistema o povo exerce a chamada democracia
directa. O poder não está concentrado na mão de uma única pessoa, o poder está
na mão de todos e todos o exercem.
Por outra, se nós temos uma
Constituição nacional, cada província pode ter a sua constituição de acordo com
a sua realidade, desde que esta Constituição não viole a Constituição Nacional,
nalguns países é assim. Neste sistema, o dirigente não se pode dar ao luxo de
ser arrogante. As instituições se tornam fortes. Por exemplo, veja Dilma – no
Brasil, foi destituída não porque roubou, mas por causa do crime de
responsabilidade, em Angola não! Tudo que a maioria dos dirigentes do país
ligados ao regime ostenta, é resultado de branqueamento de capital, se fores
questionar o Procurador-Geral da República, ele vai alegar não ter competência,
mas ainda assim não se demite. Num país politicamente descentralizado – estamos
a falar do Federalismo, as instituições a todos os níveis se tornam fortes, até
os municípios.
No sistema actual, o
administrador depende do governador e há problemas de implementação de programas.
Já no Estado Federal – Viana, por exemplo, teria água há muito tempo, porque o
próprio Parlamento controla o governo municipal, o Parlamento municipal discute
os programas a serem implementados e fiscaliza-os directamente, isso promove o
desenvolvimento, crescimento e bem-estar e proporciona a concorrência salutar entre
os municípios e província, por exemplo, o governador de Luanda visita Benguela,
vai copiar para melhorar a sua província, e tal, também poderá, obviamente,
acontecer a nível dos municípios. Essa é a grande diferença entre o Federalismo
e o Estado unitário vigente que significa eu, e o Federalismo que significa
nós. Daí que assumo, sermos a única força política em Angola com ideias novas.
DP: Senhor Sapalo, caso for eleito presidente da
República de Angola, será que haverá países com os quais poderá preterir a
relação?
SA: Vou estabelecer prioridade, aliás, está no manifesto da
minha candidatura, a prioridade é manter e privilegiar a relação com todos os
países Federais do mundo. A seguir, com os que chamamos de países
«semifederais» - baseados na descentralização política e administrativa, o caso
por exemplo, de Portugal. Hoje Portugal não é um Estado unitário e também essas
teorias já são discutidas, todos aqueles países em que os governos municipais
são eleitos, e porque em termos de teorias políticas, a democracia só começa
com as autarquias, quer dizer que todos os países onde há autarquias pois
trata-se de um poder imanados pela Constituição, não podemos considera-los de
Estados unitários… o uno-indivisível ok – quando numa Constituição se coloca
que o país é uno-indivisível não quer dizer que é a forma de organização do Estado,
mas sim com os limites geoterritoriais.
Portanto, para terminar, a
nossa prioridade será com países Federais e semifederais. A seguir a nossa
relação com os partidos que comungam a nossa ideologia política, pois o PRS é
de Centro Esquerda, então, vamos manter relações com partidos de centro
esquerda, pois jamais tivemos orientação comunista como o MPLA. Por exemplo, se
olhar com profundidade ao MPLA, vai ver que o MPLA não é de matriz democrática,
porque a sua característica é mesmo a dos comunistas que é a de imutabilidade –
quer dizer que não pode aceitar a mudança, pode haver mudança a nível interno,
mas na sua cabeça deles, não pode haver outra formação política a governar o
país.
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