CAÇA ÀS BRUXAS NA QUIÇAMA
Por Diogénes Van-Dúnem
Com a
reorganização político-administrativa da província de Luanda, o município da
Kissama, que antes pertenceu a província do Bengo, passou a fazer parte da
Capital do País (Luanda). Na sequência desta mudança, e após ter sido indicado
para liderar Luanda, o Governador Provincial, general Francisco Higino Lopes
Carneiro, designou novos administradores municipais, a fim de o ajudarem na
gestão das diferentes municipalidades que compõem a província. Para o município
da Kissama, por exemplo, foi indicado o engenheiro Vicente Soares, etnicamente
proveniente da referida região territorial do País.
A indicação de
Vicente Soares coincidiu com a necessidade, sentida pelo Governador da Província,
Francisco Higino Lopes Carneiro, de compatibilizar os cargos governamentais com
a titularidade dos comités municipais do partido MPLA em Luanda, a fim de,
segundo adiantou na altura, dar maior protagonismo e poder aos mesmos e, desse
modo, ultrapassar as dificuldades verificadas nos consulados dos governantes
que o antecederam, uma vez que na Capital do País, constantemente,
registavam-se colisões de interesse, das mais variadas índoles, pois é nesta
província onde residem a maioria dos chefes, tornando a governação desta
difícil. “Aqui há muitos chefes, todo mundo é general e todos querem mandar”,
afirmara o ex-governador provincial de Luanda, Bento Sebastião Francisco Bento,
durante a cerimónia oficial de apresentação e passagem de pasta ao general
Francisco Higino Lopes Carneiro.
Se, ao efectuar
tais mudanças, a estratégia da direcção central do MPLA, que dirige o País há
mais de quarenta anos, foi fazer o melhor que podia para corrigir os erros
crassos na governação da Nação e procurar, assim, obter resultados mais
satisfatórios no próximo pleito eleitoral (imaginando-se no cenário em apreço:
Eleições Gerais justas, livres e transparentes em 2017), tal não foi a
percepção de Vicente Soares ao chegar à Kissama. Pois, desconhecedor das lides
políticas no geral e dos meandros político-administrativo e partidário da zona,
em particular, (embora tenha nascido lá) foi incentivado por elementos bem
posicionados no seio do MPLA Luanda a fim de aceitar a indicação como Administrador
Municipal e Primeiro-secretário do partido, porquanto estes far-lhe-iam todo o
trabalho necessário de bastidores. Vicente Soares, que sempre se dedicou a
actividade religiosa, tendo estado ligado à igreja das Testemunhas de Jeová, de
que foi ancião, aceitou, por ingenuidade, o desafio de ir dirigir o município
da Kissama. Posto lá, foi instrumentalizado pelas pessoas do MPLA que o
indicaram.
Exonerou e
nomeou mais de 45 funcionários na Administração Municipal, desde responsáveis à
trabalhadores de base, e renovou ainda em mais de 80 por cento o pessoal afecto
ao secretariado executivo do Comité Municipal do MPLA na Kissama, durante a
realização das conferências municipais que elegeram os delegados ao Congresso
dos camaradas, realizado em Agosto último, designando indivíduos que, na maior
parte, até desconhece.
A remodelação
está sendo interpretada pela classe política local como uma caça política às
bruxas àqueles que, num passado tão recente, se recusaram apoiar uma
candidatura à direcção do MPLA e da Administração Municipal da Kissama, em nome
de Januário Bernardo.
Segundo consta,
Januário Bernardo, que já foi Administrador Municipal da Kissama e,
posteriormente, do Ambriz (onde foi afastado por gestão danosa), com passagem
ainda pela Unidade Técnica de Gestão do Programa Municipal Integrado de Combate
à Fome e a Pobreza, no Governo Provincial de Luanda (onde também foi demitido
por actos ilícitos), tencionava regressar como administrador municipal e, agora
também, primeiro-secretário do MPLA na região, mas a sua candidatura foi
inviabilizada, por falta de apoios locais, uma vez que a maior parte dos
dirigentes da Kissama já sabiam a “má fama” deste, afirmou fonte ligada ao
Comité Municipal do partido MPLA.
Todavia, não
tendo cruzado os braços, Januário Bernardo encontrou apoio em Manuel António
Sondoca, ex-Administrador comunal do Mumbondo, que se encarregou de mandatar
oficiosamente a candidatura daquele, ainda no consulado do ex-Administrador
Municipal, Domingos Fortes. “Não tendo obtido sucesso e exonerado de Mumbondo
por Domingos Fortes, o camarada Manuel António Sondoca informou à Januário
Bernardo, que em coluio com outros camaradas do Comité Provincial cozinharam
tudo para a saída de Domingos Fortes (que por sinal, foi exonerado, não obstante
ser general afecto à presidência da República e cunhado de Edeltrudes Costa,
ex-Ministro de Estado e Chefe da Casa Civil do Presidente!), dando lugar à
Vicente Soares, de que o camarada Januário Bernardo se diz ser afiliado”,
reafirmou a fonte do MPLA local.
Alegadamente, Januário
Bernardo e “comparsas”, aproveitando a inexperiência política de Vicente
Soares, infiltraram pessoal da sua confiança nos órgãos de direcção da
Administração Municipal e do partido, com o intuito destes prepararem as
condições a fim do mesmo tornar-se, logo após as Eleições Gerais de 2017, no
novo Administrador Municipal e Primeiro-secretário do MPLA na Kissama, na senda
da remodelação governamental que será efectuada fruto do pleito eleitoral que,
provavelmente, será vencido pelo MPLA, caso a oposição jamais se una numa única
frente comum.
A fonte afirma
que “embora tardio, Vicente Soares apercebeu-se do sucedido, mas já tarde
demais mesmo, e com poucas possibilidades de refazer os erros que cometeu. Ficou
sem muitas margens de manobras e chegou a manifestar por diversas vezes
arrependimento. «Não é a minha vontade, mas tem de ser feito, não depende
somente de mim, eu até nem gosto muito de estar na política, como é do vosso
conhecimento, só que já aceitei, confidenciou o administrador uma vez»”.
Além da
Administração Municipal, a nível partidário, Domingos Miguel Pascoal é o rosto
mais visível da infiltração perpetrada por Januário Bernardo. Retirado no seio
dos desalojados da Chicala 2, que foram parar à Kissama (vulgo “Ilha Dourada”),
por castigo do Governo Provincial de Luanda, Domingos Miguel Pascoal foi eleito
Segundo-secretário municipal do partido, nas vésperas do último congresso do
MPLA. “Ninguém se atreveu a questionar porque tudo foi cozinhado a partir de
Luanda. A orientação era para todos darem prioridade a lista de nomes vindos da
estrutura provincial, o que fizemos, cegamente. Nem mesmo Vicente Soares
conhecia boa parte dos camaradas que constavam da lista e o Januário Bernardo
chegou a ligar para muitos camaradas na Kissama a avisá-los que haveriam de
sair e não deviam mostrar quaisquer resistência, caso contrário cairiam no
esquecimento total e todas as portas lhe seriam fechadas naquela região, pois o
pessoal que vai mandar por lá é seu e, por enquanto, ele estaria do lado de
fora garantindo a limpeza, até criar as premissas necessárias que lhe permitem
voltar a dirigir aquela circunscrição territorial”, disse a fonte.
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